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Comunicação científica será decisiva na COP30, defendem especialistas em debate da RedeComCiência

Evento reuniu jornalistas e cientistas para discutir estratégias de engajamento social e enfrentamento ao negacionismo climático

 

Tamires Tavares

 

“A questão climática deixou de ser científica — agora é de comunicação”, afirmou o físico Paulo Artaxo no webinário “COP30 e o Papel da Comunicação Científica na Agenda Climática Global”, promovido no dia 23 de outubro, de forma virtual, pela Rede Brasileira de Jornalistas e Comunicadores de Ciência (RedeComCiência). O evento reuniu nomes de destaque do jornalismo e da ciência climática no Brasil para discutir estratégias de enfrentamento ao negacionismo, ampliação do engajamento social e fortalecimento da cobertura jornalística diante do maior encontro internacional sobre o clima já sediado no país, que acontecerá em novembro, em Belém (PA).

 

A sessão foi aberta pelo presidente da RedeComCiência, Ricardo Machado, e pela vice-presidente, Ana Paula Artaxo, que ressaltaram a importância de fortalecer redes de comunicadores e jornalistas para uma cobertura mais qualificada e plural da agenda climática. Ambos destacaram que, com a COP30 acontecendo no Brasil, a imprensa nacional terá um papel ainda mais estratégico na mediação entre ciência, política e sociedade.

 

Participaram do debate a jornalista Ana Lucia Azevedo (O Globo), a jornalista Claudia Antunes (Sumaúma – Jornalismo do Centro do Mundo), o próprio Artaxo (Universidade de São Paulo – Centro de Estudos da Amazônia Sustentável) e a jornalista Roberta Jansen (O Estado de S. Paulo), com mediação de Isis Diniz (Instituto de Energia e Meio Ambiente / RedeComCiência).

 

Paulo Artaxo foi incisivo ao afirmar que a COP30 será “um divisor de águas” na governança climática global, pois ocorrerá em um contexto em que o planeta caminha para ultrapassar a meta de 1,5 °C de aquecimento estabelecida pelo Acordo de Paris. Para ele, a comunicação terá papel central ao traduzir negociações técnicas e geopolíticas em mensagens claras e mobilizadoras para a sociedade. Ele também alertou para “armadilhas narrativas” que podem esvaziar a pressão política, como a normalização do overshoot — o “ultrapassar temporário” das metas — como justificativa para adiar ações concretas.

 

A jornalista Ana Lucia Azevedo destacou que o maior desafio da cobertura climática não é a complexidade da ciência, mas o desinteresse e o distanciamento do público em relação ao tema. Para ela, jornalistas e comunicadores precisam criar pontes entre a escala global da crise e a realidade cotidiana das pessoas. “Não é a ciência que afasta as pessoas, é a falta de conexão com a realidade concreta delas”, afirmou. Segundo Ana, a repetição de narrativas catastrofistas, sem personagens e histórias humanas, tende a reforçar a sensação de impotência — e não o engajamento.

 

Já Claudia Antunes ressaltou que a realização da COP30 na Amazônia oferece uma oportunidade inédita de descentralizar o debate climático e dar visibilidade a territórios historicamente marginalizados nas negociações internacionais. Ela destacou, como exemplo, a desigualdade na arborização urbana de Belém e a vulnerabilidade socioambiental de bairros periféricos, temas que poderiam pautar a conferência de forma mais próxima da realidade local. “É uma chance de mostrar que a crise climática não se resolve apenas nos corredores diplomáticos, mas também nas cidades, nas comunidades, nos territórios”, disse.

 

Com ampla experiência na cobertura de conferências internacionais, Roberta Jansen foi direta: “Há uma crise de comunicação climática”. Para ela, a ciência já consolidou diagnósticos e cenários, mas não alcançou a população de forma efetiva. “Sem pressão popular, nada muda. E essa pressão não existe sem informação acessível e envolvente”, afirmou. Roberta destacou que reportagens sobre clima costumam ter baixa audiência — seja por exaustão informativa, seja por desinteresse — e defendeu que a cobertura precisa explorar novos formatos, com narrativas mais humanas, que aproximem conceitos técnicos de temas como saúde pública, alimentação e desigualdades sociais.

 

Os debatedores também defenderam a diversificação de linguagens e formatos como forma de romper bolhas e alcançar públicos mais amplos. Exemplos citados incluíram podcasts, histórias em quadrinhos, vídeos curtos e o uso de referências culturais populares, como o futebol. Para eles, a comunicação climática ainda é excessivamente elitizada, tanto nos meios jornalísticos quanto nos espaços de divulgação científica — e precisa ser expandida a partir de outras vozes, incluindo povos indígenas, comunicadores comunitários e movimentos sociais.

 

Outro ponto de consenso foi a necessidade de evitar narrativas simplistas de “fracasso” ou “sucesso” sobre a conferência. Segundo Paulo Artaxo, a COP30 não resolverá, sozinha, os problemas estruturais do país, mas será uma arena estratégica para definir caminhos e cobrar compromissos. “A COP não é mágica. Ela trata da agenda global, e mesmo isso é um desafio enorme. Questões estruturais do Brasil precisam ser resolvidas internamente”, disse.

 

O webinário encerrou com um chamado para que jornalistas e comunicadores brasileiros se preparem de forma estratégica para a cobertura da COP30. E, para os especialistas, isso inclui compreender a complexidade das negociações multilaterais, planejar pautas de longo prazo, evitar reducionismos e construir narrativas que articulem ciência, política e justiça climática.

 

A gravação completa do debate está disponível no canal da RedeComCiência no YouTube. A organização continuará promovendo debates e formações sobre os desafios da comunicação científica. Acompanhe a divulgação nas nossas redes sociais e participe!



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